sexta-feira, 5 de fevereiro de 2021

Antes do futuro

Ondas de Mudança


Todos sabemos que viagens no tempo têm sido alvo de imensa ficção nos últimos tempos, desde palavras no papel até ao grande ecrã. E se fosse possível ver o nosso futuro a partir do que partilhamos no facebook? É com isto que Emma e Josh se deparam, uma autentica janela para o futuro. Conseguirão dois jovens de 15 anos lidar com o que descobrem?

Tudo começa quando o pai de Emma lhe oferece um computador, mas não se deixem enganar, não é portátil, é, sim, um computador fixo, provavelmente gigantesco. Não nos podemos esquecer, estamos em 1996, a internet é algo relativamente novo e nunca ninguem ouviu falar de algo tão absurdo como o “Facebook”.

Sabendo que Emma tem um computador novo, Josh, o seu melhor amigo desde sempre e também o seu vizinho do lado, oferece-lhe um CD-ROM com 100 horas de internet incluidas. Apesar de se conhecerem desde crianças, Emma e Josh estão a passar por um momento complicado na sua relação, não estando tão próximos quanto costumavam ser.

Ao instalar o CD-ROM, os dois jovens encontram uma estranha página chamada Facebook. Estão na conta de Emma, embora esta não se lembre de alguma vez ter ouvido falar de tal página, quanto mais ter conta criada! No entanto, a Emma das fotografias do Facebook parece diferente, mais velha. E as datas? De quinze anos mais tarde. Só podia ser uma partida, alguém muito engenhoso estava a tentar enganá-los. 

Com o tempo, vieram a perceber que aquela página era realmente do futuro, todos os dias o Eu mais velho de Emma publicava frases acerca da sua vida. Não era apenas um vislumbre do futuro, era a possibilidade de o alterar, cada pequeno ato ou decisão poderia alterar o que Emma publicava consoante o estado da sua vida no momento em que o fazia. Serão capazes estes dois adolescentes de criar um futuro que lhes pareça favorável? Será que as vidas com que sempre sonharam são as que, 15 anos mais tarde, os farão felizes? 

Antes de mais nada, é de realçar o quão este tema do "olhar para o futuro", tão banal atualmente, foi transformado em algo nunca antes visto. Jay Asher e Carolyn Mackler pegaram em coisas banais do atual e antigo quotidiano e conseguiram criar um enredo original. 

Falando no antigo quotidiano, este livro leva-nos até 1996, um tempo em que a internet era novidade, os telemóveis raros, o telefone fixo a principal forma de comunicação tecnológica e o modo de vida extremamente diferente. Os adolescentes não passam horas nas redes sociais, passam-nas antes com os seus amigos ou a fazer desporto. Os autores retrataram isso muito bem, no entanto, gostava der ter acesso a uma imagem mais clara desse quotidiano. Sydney Mills tem um telemóvel, o primeiro pensamento que me vem à cabeça é de que é um "Flip phone", mas provavelmente não é, será um calhamaço enorme com uma antena ainda maior.


Mais uma vez, achei que faltava, não uma descrição física das personagens, mas alguma profundidade nessa mesma descrição. Era-nos dito que certa pessoa é bonita, “giríssima” até, com cabelo a cair pelos ombros, mas nada que me fizesse ter uma imagem mental da personagem, ou pelo menos alguém em quem a visualizar. Eram apenas descrições vagas. Claro que podemos afirmar que é para dar a ideia de que isto se passa com adolescentes normais como qualquer um de nós já foi, mas, para mim, simplesmente não funcionou. 

O estilo de escrita é simples e bastante acessível, como se fosse escrito de um adolescente para um adolescente. Claro, é um estilo agradável para todas as idades, mas é informal o suficiente para captar a atenção dos mais novos. A narrativa é contada alternadamente do ponto de vista de Emma e Josh, sendo a mudança de  perspectiva feita de capítulo para capitulo. 

Essas mudanças de narrador são feitas com uma precisão metódica, quando se dá um acontecimento marcante para a Josh ou Emma, termina o capitulo e começa um novo sob os olhos do mais afetado, permitindo-nos aceder ao parecer dessa personagem em primeira mão.

Por fim, apesar de não ter sido um livro que me obrigasse constantemente a passar a página, foi uma leitura interessante. Não me cativou especialmente ao ponto de o devorar, mas é uma leitura leve, ideal para passar um bom bocado na companhia de um livro.



sábado, 30 de janeiro de 2021

A Sombra da Sereia



Magnus desapareceu sem qualquer rasto,  deixando para trás a sua mulher e seus dois filhos, Elin e Ludvig, ainda crianças. E Patrick Hedström está encarregue de solucionar o estranho desaparecimento deste homem...

Após a reconstrução do dia em que Magnus desapareceu, não havia nenhuma pista acerca do seu paradeiro. Cia, a mulher do desaparecido, todas as semanas se dirigia à esquadra de Tanumshede para saber se havia novidades do caso do seu marido. Patrick sentia-se pressionado e,  ao mesmo tempo, incapaz de trazer paz àquela família. 

Ao mesmo tempo, acompanhamos o lançamento do livro,  "A Sereia", de Christian Thydell, amigo de Erica, esposa de Patrick. Este homem era atormentado por cartas ameaçadoras, cujo início remonta ao momento em que começou a escrever o seu livro. 

Agora, sabemos que não é único a receber ameaças. Eric, também as recebia. O estranho é que Eric, Magnus, Christian e Kenneth eram amigos. Estariam estas cartas ligadas ao desaparecimento Magnus? 

Erica, grávida de gémeos, tenta convencer Christian a denunciar as ameaças à polícia mas ele parece não querer ceder. Quando Erica percebe que conhece bem o seu amigo, começa a investigar o seu passado, mas sem sucesso. Que teria este homem para esconder? 

Como sempre, Camilla Läckberg surpreende pela facilidade da leitura. A linguagem simples, concreta e direta concede à obra um carácter leve e agradável. No entanto, no início, não me prendeu. Pode ser por estar habituada ao estilo desta escritora, que vai aumentando o suspense.

Como disse, este livro não me agarrou por inteiro, apenas a mais ou menos a partir do meio é que comecei a ficar realmente cativada. Foi nessa altura que se começaram a revelar alguns segredos. Entendo que a escritora não queira revelar tudo de uma vez, mas já provou que tem capacidade de não o fazer e, por isso, não percebo qual a necessidade de um inicio tão monótono, capaz de perder novos leitores.

Mal os segredos começam a ser desenterrados, a história ficou deveras interessante. O enredo é completamente alucinante, na falta de melhor palavra para o descrever. O final foi surpreendentemente inesperado, indo completamente contra todas as convicções que o leitor possa ter formado ou adquirido de acordo com as revelações feitas ao longo da segunda metade da obra.

Ao contrário do que se possa pensar, a personagem que mais me surpreendeu, pela positiva, neste livro foi Bertil Melberg, o preguiçoso superintendente da esquadra de Tanumshede. Este homem, normalmente arrogante, adquire uma nova faceta quando se encontra perto do neto da sua namorada. Demonstra uma ternura que nunca pensei ver naquela personagem.

Por outro lado, pela negativa, surpreenderam-me as personagens que faziam parte do circulo de amigos de Magnus. Todas elas parecem saber alguma coisa, mas nada revelam, mesmo sabendo que isso os poderia colocar em perigo. Intriga ou não, deixou que pensar.

Assim, apesar de não o início desta obra não me ter agradado, o final compensou. Deixou em mim uma onda de curiosidade relativa ao próximo livro desta coleção...

sábado, 4 de abril de 2020

Vampiros do Norte

Vampiros, Espíritos e Lobisomens...

Antes de mais, gostaria de agradecer à editora Chiado por me ter gentilmente cedido um exemplar de Vampiros do Norte, de João Carlos Pinto, para leitura e crítica aqui no blogue.

A nossa história começa com a apresentação de Trigo Roxo, mais commumente chamado TR, inspetor da PJ portuguesa, considerado o mais temido em todo o mundo. Consta que só de saber que Trigo Roxo está ao seu encalço, os criminosos se entregavam às autoridades com vista a reduzir as suas penas, uma vez que iriam acabar presos de qualquer maneira.

Logo a seguir, é-nos narrada, por TR, a conversa com o seu chefe que levou a todas as peripécias desta história. Algures no Norte de Portugal um assassino em série está em ação: mata as suas vítimas fingindo-se de vampiro, deixando-as sem uma pinga de sangue. O chefe parece não dar o devido valor ao seu inspector mais valioso, chegando ao ponto de lhe dizer que está destacado para o caso porque todos os seus colegas competentes já estão ocupados.

Este inspetor, após se despedir da sua família, parte imediatamente para o Norte do país para investigar o caso e trazer o assassino à justiça. Falando com os locais, descobre que o suspeito se dá pelo nome de V e que até certa idade, foi uma pessoa normal como todas as outras, mudando-se depois para um castelo remoto da sua família. 

Agora, V está a monte, rumo a França, para representar a comunidade vampírica portuguesa num Congresso destinado a vampiros. Como seria de esperar, Trigo Roxo, segue as pistas deixadas por este criminoso até esse congresso, disfarçando-se de vampiro para poder entrar sem ser descoberto. Aí, encontra algo que faz mudar completamente o rumo desta investigação.

Ao longo de toda a narrativa, são-nos apresentados episódios de investigações passadas deste inspetor, desde operações no vaticano, a pedido do Papa, a missões na Rússia, a pedido do presidente deste país.

Devo dizer que este livro me surpreendeu pela positiva, nas primeiras páginas, estava quase para desistir da leitura, achava que se tratava apenas de uma sequência de episódios absurdos e sem qualquer nexo. Ora, não é bem assim.

Todo o livro é uma sátira repleta de criticas sociais e políticas. Por vezes achei as alegorias demasiado exageradas e nem sempre consegui apreender a mensagem lá contida. Claro que houve episódios que me levaram a pensar imediatamente em certos acontecimentos reais, mas outros... Posso ser eu a simplesmente não conseguir associar eventos concretos aos retratados no livro, mas, na minha opinião, alguns eram deveras rebuscados. 

Assim, tive dois tipos de reações aos diversos episódios: uma, em que compreendia a mensagem das entrelinhas e o paralelismo entre a ação narrada e a atualidade; e outra, em que não fiz qualquer associação com a realidade e achei os eventos simplesmente absurdos. 

Como disse, a história é narrada pela personagem principal, Trigo Roxo, tratando-se de um discurso leve e quase de conversação. Sentimos que TR está a contar-nos histórias da vida dele, como se fossemos velhos amigos. Apesar de isto dar um caráter descontraído ao livro, faz com que se percam muitos pormenores, não há descrições que nos façam sentir que estamos no locais de ação com as personagens.

Algo que me causou alguma confusão, foi o facto de as personagens serem tratadas pelas iniciais. Após uma primeira apresentação, deixávamos de ver os nomes para ver só, como no caso de Winston Churchill (sim, é uma personagem desta narrativa), WC. Inicialmente gostei desta abordagem, mas depois de tantas personagens, perdi um pouco o fio à meada, como se costuma dizer, e não conseguia acompanhar quem era quem...

Quanto ao estilo de escrita, todo o livro estava eximiamente escrito em termos ortográficos e sintáticos, mas a escrita precisava de ser limada e aperfeiçoada. A ação é muito rápida, passamos de um momento de vida ou de morte ou de uma tomada de decisão vital para uma atitude calma e relaxada por parte das personagens. Senti que tudo estava apressado. Até mesmo as narrativas secundárias, na minha opinião, deviam ser menos e mais alongadas e pormenorizadas. 

Para terminar, apenas uma pequena nota: o livro tem imenso potencial, mas peca pelo exagero, apresso, estilo de escrita e descuido de pormenores importantes. No entanto, vejo esta obra como um possível sucesso caso sejam aperfeiçoadas certas vertentes.

segunda-feira, 27 de janeiro de 2020

A Amiga

Talvez não seja o nome certo...

A amiga é o mais recente livro de Dorothy Koomson, autora de A Sereia de Brighton e Um novo Amanhã. Já li este último e adorei. Posso já revelar que a amiga teve o mesmo efeito.


Inicialmente pensamos que a história gira à volta de Cece Solarin, uma mulher casada e desempregada, com três filhos  e um marido trabalhador. Sol, o seu marido foi promovido no emprego e viu-se obrigado a mudar-se de Londres para Brighton. A família seguiu-o passado três meses e Cece teve de deixar o seu emprego. 

Agora, numa nova cidade, sem amigos, coloca os filhos numa escola primária privada a pedido do seu marido, este pensava que, com as novas possibilidades financeiras, deveriam dar o melhor aos seus filhos. Lá, Cece percebe que algo não está bem, há uma atmosfera pesada, segredos e intrigas. 


Afinal, a escola não era tão pacífica como se acreditava. Yvonne, uma mãe extremamente presente na vida das filhas e presidente da associação de pais, tinha sido espancada quase até à morte no recinto escolar durante as férias. Ninguém sabia o que tinha acontecido, mas as suas três amigas eram as principais suspeitas. 

Cece, que já tinha recebido treino para se tornar policia, embora nunca tivesse seguido essa carreira, não deixa de ficar intrigada com este caso e com o facto de as pessoas agirem de forma tão suspeita em torno do acontecimento. 

Assim, ao tentar integrar-se naquele que ia ser o seu novo quotidiano, torna-se próxima das amigas de Yvonne: Maxie, Anaya e Hazel. Não percebe como uma destas seria capaz de um ato tão horrível e começa a sua própria investigação para perceber o que realmente se passou naquele fatídico dia. Esta investigação traz à superfície vivências do passado de todas as personagens, revelando segredos há muito escondidos e arrependimentos há muito esquecidos.

A primeira coisa que tenho a dizer sobre esta obra é que não desapontou, é um daqueles livros que nos deixam simplesmente com fome de mais. Há já algum tempo que não lia um livro com tão boa qualidade, quer em termos do enredo, quer em termos de escrita. O estilo de escrita que Dorothy Koomson é simples e agradável, mas sem perder uma certa complexidade, um certo mistério nas palavras que completa o enredo de forma fascinante.

A história é narrada do ponto de vista das varias personagens, o que nos permite ter acesso a informações privilegiadas, ou seja, é como uma espreitadela para as vidas das personagens e para os seus pensamentos mais profundos. Há todo um enredo alucinante, uma série de reviravoltas impensáveis e acima de tudo, nada de previsível. Sempre que pensamos saber alguma coisa com certeza dá-se um acontecimento inesperado que faz tremer toda a rede do que pensamos conhecer.

Sinceramente, não há muito mais que eu possa dizer acerca desta obra, pouco de mau tem. É uma história de perseverança, intriga e força de vontade, com personagens verosímeis que podiam ser qualquer um dos nossos conhecidos.

Por fim, resta-me apenas agradecer à Porto Editora por me ter cedido um exemplar desta obra, A Amiga, de Dorothy Koomson, um livro inesquecível.






quarta-feira, 4 de outubro de 2017

Alice no País das maravilhas

De volta ao país das maravilhas...


Mais uma vez, trago-vos o clássico "Alice no País das Maravilhas", mas agora, com um "twist". A edição que vos apresento hoje faz parte da já minha conhecida coleção "Os Livros estão loucos". 

Penso que este livro não precisa de apresentações, já todos o conhecemos, no entanto tenho de dar a conhecer a Mariana e o Simão, que nos acompanham ao longo da história e vão fazendo aquelas perguntas que sempre concebemos mas não temos a coragem fazer a Alice ou, pelo menos, que não nos parecem fazer sentido, mas, neste livro, o que faz? 

Se precisarem de um "refresh" na memória acerca da história desta obra intemporal de Lewis Carroll, poderão ler a minha opinião da história original aqui.

Parece-me que o enquadramento de Alice no País das Maravilhas na colocação na coleção "Os Livros estão Loucos" da editora Guerra e Paz foi o mais bem conseguido de entre as obras já editadas neste formato, como:

Tudo nesta obra encaixa bem, desde a própria história às imagens malucas que a acompanham. Entramos num universo quase psicadélico   de Alice ao ler este livro.

As cores berrantes, as imagens malucas, as letras que saltam das páginas,(…) conferem ao livro um carácter divertido, combinamndo perfeitamente com a narrativa.

A linguagem é extremamente acessível, como diz o slogan, é contada "Tipo aos jovens", o que permite desfrutar de uma leitura suave, rápida e extremamente divertida.

Esta coleção está realmente muito boa, adaptando clássicos da literatura que, de outra forma, nunca teria a coragem de ler.

Por isso, espero que, um dia, sejam adaptadas mais obras, no entanto, não me parece que nenhum fique tão brilhante como  Alice no País das Maravilhas.

Finalmente, quero agradecer à editora Guerra e Paz pelo exemplar que me cederam e os bons momentos que a sua leitura me proporcionou!

domingo, 24 de setembro de 2017

A Ilha das Quatro Estações

Quatro estações, uma ilha...

Antes de mais, quero agradecer à Clube do Autor por me ter cedido  um exemplar de A Ilha das Quatro Estações!

Este livro é da autoria de Marta Coelho, licenciada em Ciências da comunicação. Foi também argumentista da série juvenil Morangos com Açúcar.

A Ilha das Quatro Estações retrata a história de quatro adolescentes, cada um com os seus demónios, e a sua estadia na tal ilha, a Ilha das Quatro Estações. O nome deve-se ao facto de a ilha estar dividida em quatro secções, cada uma com o clima e decoração da respetiva estação do ano.

Para lá vão adolescentes atormentados e, por vezes, considerados problemáticos. São-nos apresentados Catarina - Cat - Santiago - Tiago ou Santi - Misha e Rute. Deste grupo, apenas Santi se inscreveu por vontade própria no programa da Ilha. Lá, teriam de trabalhar durante um mês em cada estação.

Cat sofre com a perda da sua melhor amiga, Clara, cuja morte pensa ter sido sua culpa. Santi é atormentado pela falta de memória de um acidente de mota em que esteve envolvido, sabendo que alguém se magoou seriamente. Misha luta contra uma depressão profunda. Rute faz tudo para fugir ao namorado abusivo e aos pais que não a apoiam.

Santi e Cat apaixonam-se loucamente um pelo outro, ajudando-se mutuamente a superar o que os levou à ilha. Tomam como sua missão alegrar Misha e fazê-lo falar de novo. Quando conseguem, estes três tornam-se inseparáveis. Só mais tarde é que Rute se junta ao grupo, notando-se alguma mudança nas outras personagens, já que esta as inspirou a serem mais fortes.

Mas nem tudo é bom na ilha, alguém anda a deixar mensagens ameaçadoras a Cat e Santi. Primeiramente estes não lhes dão muita importância, mas, quando recebem fotos suas num envelope, as coisas tornam-se mais sérias...

Em primeiro lugar, é de salientar que este é um ótimo livro para férias ou simplesmente para relaxar. É uma obra leve e de rápida leitura. No entanto, penso que lhe falta alguma complexidade. 

Senti, ao ler, que se tratava de um guião e não propriamente de uma narrativa. O diálogo é abundante, ocupando cerca de 90% da obra, conferindo-lhe a tal simplicidade que já referi. 

Não há uma caracterização de espaços, personagens ou atitudes com a profundidade certa. Por exemplo, ocorrem diversas situações em que nos é dito "Ela sorri" e é assim que podemos ter acesso ao estado de espirito das personagens, de uma forma muito crua e simplista, sem grande complexidade. A isso acrescenta-se o facto de as histórias das personagens serem contadas na primeira pessoa, sem grandes pormenores. Considerei, genuinamente que faltava complexidade ao livro.

Por outro lado, a ação decorre demasiado depressa: mal começou o livro e já Cat e Santi estão apaixonados, por exemplo. Há, ainda, diversos pormenores pouco realistas, como certos riscos e atitudes que as personagens tomam e até mesmo a natureza da ilha.

Há alguns indícios que anunciam um grande mistério, algo que poderia revolucionar a estadia dos adolescentes na ilha, mas que, na realidade e na minha opinião, não aconteceu. O final deixou-me deveras desiludida. Apesar de toda a história ter um fio condutor defeituoso, digamos, o final foi um corte total com tudo o que poderíamos pensar e não se tratou de uma daquelas revelações que mudam o curso da ação, é apenas muito apressado.

Dito isto, penso que esta seria uma ótima obra para uma adaptação televisiva. Posso ter a mente toldada pelo facto de a autora ter sido argumentista, mas realmente considero que a obra se assemelha a um guião televisivo...

quinta-feira, 14 de setembro de 2017

Filhas Exemplares: A Vida Secreta das Mulheres que estão a transformar o Mundo Árabe.

"A vanguarda mostra-se assim: de rabo de cavalo, a rir e a comer gomas."


Katherine Zoepf, Autora de Filhas Exemplares: A Vida Secreta das Mulheres que estão a transformar o Mundo Árabe  é oriunda de Cincinnati, EUA. Licenciou-se na universidade de Princeton e na London School of Economics. 

Antes de mais, devo agradecer à ASA pela gentil oferta de um exemplar desta obra para opinião e divulgação aqui no blogue.

A autora, ao longo do livro, vai dando acesso ao leitor a partes da sua evolução pessoal. Ficamos a conhecer as razões pelas quais a sua vida levou um rumo tão peculiar: "Trabalhou como correspondente para os jornais The Times e The New York Times a partir de países como o Líbano, a Síria e o Iraque.". 

Katherine estava a trabalhar quando se sucedeu o 11 de setembro, ficando motivada a ver o Mundo Árabe pelos seus próprios olhos, a tentar descortinar os segredos ocultos nessa cultura tão diferente daquela a que estava habituada.

A explicitação das razões pelas quais a autora partiu numa jornada que muito poucos teriam coragem para fazer é, sem dúvida, um ponto a favor da qualidade deste livro, dá-lhe um certo realismo. Denota-se a revolta nas suas palavras, mas não uma revolta faminta de vingança. É sim, uma revolta ansiosa por compreensão.

Por outro lado, os longos trechos descritivos acerca da adaptação de Katherine ao Mundo Árabe tornaram-se bastante aborrecidos. Todos eles tinham uma mensagem a transmitir, mas, na minha opinião, não eram estritamente necessários ao longo do livro. Por exemplo, a autora relata minuciosamente a aprendizagem de Árabe, abordando um colega de turma americano que adotara uma visão intransigente e cruel acerca do papel da mulher na sociedade. Tenho noção que é um exemplo significativo de discriminação vinda de uma pessoa tomada como "ocidental", no entanto, tendo em conta o tema do livro, estava à espera de mais relatos acerca da Vida Secreta das Mulheres que estão a transformar o Mundo Árabe, que apenas é retratada com profundidade mais à frente no livro.


Filhas Exemplares não é um livro comum sobre o Mundo Árabe. Retrata a história de mulheres, não como ideias ou imagens abstratas, mas como seres humanos normais, valiosos  e iguais a todos os outros. Deixamos de ver apenas mulheres e passamos a ver vidas, sentimentos e, acima de tudo, vontades.

Algo que me impressionou imenso e me inspirou foi o facto de, como é dito no prólogo: "A vanguarda mostra-se assim: de rabo de cavalo, a rir e a comer gomas.". Com isto, a autora quer passar a mensagem de que, enquanto nós vemos mulheres oprimidas, que usam o Hijab e não saem à rua sem companhia masculina, ela viu o seu espaço íntimo em que falam dos seus desejos, ambições e carreiras. Só o facto de conferenciarem entre si sobre estes assuntos, sempre na ausência dos homens, mostra grande coragem.

A simplicidade com que são relatadas as histórias de mulheres oprimidas, agredidas e injustiçadas mostra-nos que nesse mundo, que consideramos tão distante e diferente, já há uma faísca de rebelião, de pensamento próprio, de vanguarda e luta por liberdade. 

Chocou-me imenso a história de uma adolescente que foi raptada e violada para proteger a imagem do seu pai (este traíra a sua mãe e o violador ameaçava revelar essa traição). Ora, sendo violada, perdera toda a sua honra e, consequentemente, a dos homens da sua família. Esta rapariga foi trancada numa instituição para jovens problemáticas pois as autoridades policiais receavam que a sua família a matasse para restaurar a honra. Um primo direito, que não tinha qualquer contacto com essa parte da família aceita casar com a jovem para restaurar a sua honra e acabam por se apaixonar.

Quando tudo parecia ter normalizado e o casal vivia num minúsculo apartamento, o irmão da rapariga assassina-a, esfaqueando-a a sangue frio. Segundo a lei, crimes de honra não são punidos, no entanto, o marido da jovem não se conformou. Lutou legalmente para que o cunhado pagasse pelo seu crime, mas, passados anos de processos legais, este foi ilibado e libertado. 

Apesar de não ter sido feita justiça, a história desta jovem correu mundo, revoltando até alguns dos mais tradicionais religiosos árabes. Foram criadas ONG para defender vítimas e possíveis vítimas de crimes de honra, bem como para levar à justiça quem os praticasse, demonstrando que há quem se preocupe, quem não se conforme e, acima de tudo, quem lute!

É esta e muitas outras histórias reais que são retratadas neste livro, incentivando-nos, não só à revolta, mas também à compreensão. Katherine Zoepf, ao viver com essas raparigas e acompanhar as suas histórias, consegue transmitir a sua compreensão ao leitor, mostrando que, apesar das vivências cruéis que algumas raparigas suportam, muito do que pensamos são dogmas sem fundamento.