"A vanguarda mostra-se assim: de rabo de cavalo, a rir e a comer gomas."
Katherine Zoepf, Autora de Filhas Exemplares: A Vida Secreta das Mulheres que estão a transformar o Mundo Árabe é oriunda de Cincinnati, EUA. Licenciou-se na universidade de Princeton e na London School of Economics.
Antes de mais, devo agradecer à ASA pela gentil oferta de um exemplar desta obra para opinião e divulgação aqui no blogue.
A autora, ao longo do livro, vai dando acesso ao leitor a partes da sua evolução pessoal. Ficamos a conhecer as razões pelas quais a sua vida levou um rumo tão peculiar: "Trabalhou como correspondente para os jornais The Times e The New York Times a partir de países como o Líbano, a Síria e o Iraque.".
A autora, ao longo do livro, vai dando acesso ao leitor a partes da sua evolução pessoal. Ficamos a conhecer as razões pelas quais a sua vida levou um rumo tão peculiar: "Trabalhou como correspondente para os jornais The Times e The New York Times a partir de países como o Líbano, a Síria e o Iraque.".
Katherine estava a trabalhar quando se sucedeu o 11 de setembro, ficando motivada a ver o Mundo Árabe pelos seus próprios olhos, a tentar descortinar os segredos ocultos nessa cultura tão diferente daquela a que estava habituada.
A explicitação das razões pelas quais a autora partiu numa jornada que muito poucos teriam coragem para fazer é, sem dúvida, um ponto a favor da qualidade deste livro, dá-lhe um certo realismo. Denota-se a revolta nas suas palavras, mas não uma revolta faminta de vingança. É sim, uma revolta ansiosa por compreensão.
Por outro lado, os longos trechos descritivos acerca da adaptação de Katherine ao Mundo Árabe tornaram-se bastante aborrecidos. Todos eles tinham uma mensagem a transmitir, mas, na minha opinião, não eram estritamente necessários ao longo do livro. Por exemplo, a autora relata minuciosamente a aprendizagem de Árabe, abordando um colega de turma americano que adotara uma visão intransigente e cruel acerca do papel da mulher na sociedade. Tenho noção que é um exemplo significativo de discriminação vinda de uma pessoa tomada como "ocidental", no entanto, tendo em conta o tema do livro, estava à espera de mais relatos acerca da Vida Secreta das Mulheres que estão a transformar o Mundo Árabe, que apenas é retratada com profundidade mais à frente no livro.
Filhas Exemplares não é um livro comum sobre o Mundo Árabe. Retrata a história de mulheres, não como ideias ou imagens abstratas, mas como seres humanos normais, valiosos e iguais a todos os outros. Deixamos de ver apenas mulheres e passamos a ver vidas, sentimentos e, acima de tudo, vontades.
Algo que me impressionou imenso e me inspirou foi o facto de, como é dito no prólogo: "A vanguarda mostra-se assim: de rabo de cavalo, a rir e a comer gomas.". Com isto, a autora quer passar a mensagem de que, enquanto nós vemos mulheres oprimidas, que usam o Hijab e não saem à rua sem companhia masculina, ela viu o seu espaço íntimo em que falam dos seus desejos, ambições e carreiras. Só o facto de conferenciarem entre si sobre estes assuntos, sempre na ausência dos homens, mostra grande coragem.
A simplicidade com que são relatadas as histórias de mulheres oprimidas, agredidas e injustiçadas mostra-nos que nesse mundo, que consideramos tão distante e diferente, já há uma faísca de rebelião, de pensamento próprio, de vanguarda e luta por liberdade.
Chocou-me imenso a história de uma adolescente que foi raptada e violada para proteger a imagem do seu pai (este traíra a sua mãe e o violador ameaçava revelar essa traição). Ora, sendo violada, perdera toda a sua honra e, consequentemente, a dos homens da sua família. Esta rapariga foi trancada numa instituição para jovens problemáticas pois as autoridades policiais receavam que a sua família a matasse para restaurar a honra. Um primo direito, que não tinha qualquer contacto com essa parte da família aceita casar com a jovem para restaurar a sua honra e acabam por se apaixonar.
Quando tudo parecia ter normalizado e o casal vivia num minúsculo apartamento, o irmão da rapariga assassina-a, esfaqueando-a a sangue frio. Segundo a lei, crimes de honra não são punidos, no entanto, o marido da jovem não se conformou. Lutou legalmente para que o cunhado pagasse pelo seu crime, mas, passados anos de processos legais, este foi ilibado e libertado.
Apesar de não ter sido feita justiça, a história desta jovem correu mundo, revoltando até alguns dos mais tradicionais religiosos árabes. Foram criadas ONG para defender vítimas e possíveis vítimas de crimes de honra, bem como para levar à justiça quem os praticasse, demonstrando que há quem se preocupe, quem não se conforme e, acima de tudo, quem lute!
É esta e muitas outras histórias reais que são retratadas neste livro, incentivando-nos, não só à revolta, mas também à compreensão. Katherine Zoepf, ao viver com essas raparigas e acompanhar as suas histórias, consegue transmitir a sua compreensão ao leitor, mostrando que, apesar das vivências cruéis que algumas raparigas suportam, muito do que pensamos são dogmas sem fundamento.